Qual é a possibilidade de anulação na Justiça de uma sentença arbitral?
Em 2001, o plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) julgou constitucional a Lei de Arbitragem, promulgada em 1996. O então presidente da Corte, ministro Marco Aurélio Mello, disse depois da sessão que esperava que a prática ganhasse confiança no Brasil. Quase 20 anos depois pode-se dizer que a expectativa do ministro se confirmou.
Além de ter conquistado a preferência de empresários devido à maior celeridade, as arbitragens também apresentam segurança jurídica. São praticamente inexistentes os casos de sentenças arbitrais anuladas no país.
Juízes ouvidos pelo portal de notícias jurídicas JOTA lembram da impossibilidade de rever o mérito de arbitragens. “Não é comum um questionamento quanto a um conteúdo de decisão arbitral, até porque o Judiciário não poderia fazê-lo”, afirma Bruno Bodart, juiz da 7ª Vara de Fazenda Pública do Rio de Janeiro. “O Judiciário não é uma instância recursal, não é segunda via. Na verdade, a gente só pode analisar questões específicas de nulidade”, ressalta Renata Mota Maciel, juíza da 2ª Vara Empresarial e de Conflitos Relacionados à Arbitragem da comarca da capital do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP).
Uma pesquisa feita em 2016 pelo Comitê Brasileiro de Arbitragem (CBar) em parceria com a Associação Brasileira de Estudantes de Arbitragem (ABEArb) analisou 11 casos envolvendo pedido de anulação de arbitragem no Supremo Tribunal Federal e no Superior Tribunal de Justiça (STJ). Somente dois casos tiveram a anulação mantida.
De acordo com o estudo, em ambos os casos não foram admitidos os recursos excepcionais “por falta de preenchimento dos requisitos constitucionais, não analisando, por consequência, o mérito dos recursos”. O estudo destaca também que, em nenhum caso, STJ e o STF reverteram decisões de cortes ordinárias para o fim de anular a sentença arbitral.
O artigo 32 da Lei de Arbitragem, a Lei 9.307/1996, elenca os motivos que podem levar uma sentença arbitral à nulidade. Entre eles, estão a nulidade da convenção de arbitragem, decisão proferida fora dos limites da convenção de arbitragem, e sentença proferida por quem não podia ser árbitro.
Os casos mais frequentes de pedido de anulação de sentença são ligados a uma possível parcialidade de um dos árbitros que compôs o tribunal. O artigo 8º da Lei de Arbitragem estabelece que cabe ao árbitro definir sua competência para decidir sobre o caso, princípio conhecido como competência-competência: caberá ao árbitro decidir de ofício, ou por provocação das partes, as questões acerca da existência, validade e eficácia da convenção de arbitragem e do contrato que contenha a cláusula compromissória.
Por isso, o Judiciário costuma se manifestar somente depois da sentença arbitral. Em 2018, a uma empresa do setor de telecomunicações acionou a Justiça porque entendia que cabia à 7ª Vara Empresarial do Rio de Janeiro — responsável por processar o pedido de recuperação judicial da empresa — tratar do direito dos acionistas no processo. Mas, por cinco votos a dois, a 2ª Seção do Superior Tribunal de Justiça decidiu que a competência do caso seria de um tribunal arbitral, como prevê a cláusula compromissória no estatuto social da companhia.
“Em procedimento arbitral, são os próprios árbitros que decidem, com prioridade ao juiz togado, a respeito de sua competência para examinar as questões acerca da existência, validade e eficácia da convenção de arbitragem e do contrato que contenha cláusula compromissória – princípio da ‘kompetenz-kompetenz’”, explicou à época a ministra Nancy Andrighi, reconhecendo a competência do juízo arbitral.
Fonte: Portal Jota