Novo custo para empresas em acordos trabalhistas sem reconhecimento de vínculo

Em setembro, o TST consolidou, por meio do julgamento do Tema 310 no IRR, a tese de que incide contribuição previdenciária sobre os valores pagos em acordos trabalhistas homologados judicialmente, ainda que não haja reconhecimento de vínculo de emprego. O precedente reafirma a Orientação Jurisprudencial 398 da SDI-1, agora com efeito vinculante, impondo observância obrigatória a todos os TRTs.

A decisão retira a margem de manobra que, até então, permitia às partes afastar o recolhimento ao classificar valores como indenizatórios ou de natureza civil. Ao reconhecer que a natureza da verba decorre da essência econômica e não da nomenclatura atribuída, o TST reforçou que a prestação de serviços, mesmo sem vínculo formal, gera obrigação contributiva nos termos da Constituição Federal¹ e da legislação previdenciária². 

A relevância da medida é significativa, pois altera a forma como as empresas conduzem negociações judiciais. Em cenário anterior, a atribuição de caráter indenizatório ao montante do acordo reduzia custos e limitava a incidência de contribuições. A consolidação do Tema 310 impõe que todo valor pactuado integre a base de cálculo da contribuição previdenciária, fixada em 20% a cargo da empresa tomadora de serviços e 11% a cargo do empregado, este na condição de contribuinte individual. O impacto global alcança, portanto, 31% sobre o valor do acordo. Não se trata de mera atualização jurisprudencial, mas de um divisor de águas que modifica substancialmente os custos empresariais e exige reavaliação das políticas de composição de passivos.

O efeito prático pode ser ilustrado com um exemplo simples. Em um acordo no valor bruto de R$ 100 mil, incidirá contribuição previdenciária de 20% sobre o valor total a cargo da empresa tomadora de serviços (R$ 20 mil) e de 11% sobre o mesmo valor a cargo do empregado, na condição de contribuinte individual (R$ 11 mil). 

Nesse cenário, o custo total do acordo para a empresa pode chegar a R$ 120 mil, caso o valor negociado de R$ 100 mil seja líquido para o empregado. Nessa hipótese, o empregador precisará desembolsar o valor principal acrescido da contribuição patronal.

Já se o valor de R$ 100 mil representar o montante bruto a ser partilhado entre as partes, o valor líquido efetivamente recebido pelo empregado será reduzido pela retenção dos 11% de sua contribuição. 

Em ambos os casos, o impacto previdenciário agregado corresponde a 31% do valor do acordo, devendo esse ônus ser considerado previamente nas tratativas para evitar distorções e execuções fiscais. 

Diante dessa realidade, as empresas não podem negligenciar o custo adicional, sob pena de verem seus passivos aumentarem de forma exponencial. Além do impacto financeiro imediato, soma-se a possibilidade de execução judicial em caso de ausência de recolhimento, cenário já observado em decisões recentes dos TRTs da 2ª e da 15ª regiões, que passaram a determinar prazos expressos para a comprovação do recolhimento previdenciário, reforçando a eficácia prática da tese vinculante³.

Do ponto de vista estratégico, o novo entendimento exige das empresas um redesenho das formas de negociação. As alternativas passam pela previsão do custo previdenciário já no momento da composição, a inclusão desse valor no cálculo final a ser desembolsado, a pactuação de montantes líquidos que incorporem os encargos e, em alguns casos, até o reconhecimento parcial de vínculo empregatício, com a finalidade de individualizar parcelas remuneratórias e indenizatórias. Essas soluções devem ser avaliadas caso a caso, sempre com foco na redução de riscos e na racionalização dos custos. A ausência de adaptação pode não apenas encarecer acordos, mas também expor empresas a execuções fiscais e trabalhistas, comprometendo fluxos de caixa e previsões orçamentárias.

É importante destacar que, quando já existe vínculo de emprego reconhecido em relação à empregadora direta, inclusive nas situações em que a empresa acordante figure apenas como responsável subsidiária, o Tema 310 não produz alteração prática imediata. Nessas hipóteses, a incidência previdenciária sobre as verbas de natureza salarial decorre de obrigação legal já consolidada, e as composições judiciais normalmente discriminam de forma adequada as parcelas tributáveis e indenizatórias. Isso não diminui, contudo, a importância da tese para o mercado empresarial em geral. A decisão do TST fecha a possibilidade de que acordos celebrados sem reconhecimento de vínculo sejam estruturados como indenizatórios para afastar o recolhimento, reforçando que a segurança jurídica e a transparência devem orientar as negociações. Companhias que ignorem o novo cenário podem assumir custos inesperados e comprometer sua governança corporativa.

Em conclusão, o Tema 310 do TST consolidou a tese de que a incidência das contribuições previdenciárias sobre acordos judiciais independe do reconhecimento formal do vínculo de emprego, alcançando também aqueles em que as partes atribuem natureza indenizatória aos valores ajustados. Embora o precedente assegure uniformidade e combata práticas que historicamente camuflavam obrigações tributárias, sua aplicação amplia de modo significativo os custos empresariais e restringe alternativas negociais. Essa postura rigorosa pode, em determinados cenários, gerar discussões sobre os limites constitucionais da tributação, sobretudo quando o acordo envolver parcelas que, por sua natureza intrinsecamente reparatória, não guardam relação direta com a remuneração do trabalho. 

Não se descarta, portanto, que o STF venha a ser instado a apreciar a compatibilidade do entendimento com o princípio da legalidade tributária4 e com a definição constitucional de fato gerador da contribuição social. Até que eventual revisão ocorra, permanece às empresas o dever de incorporar integralmente a carga previdenciária às tratativas, adotar políticas internas de prevenção e ajustar sua governança jurídica e financeira a uma realidade em que a antecipação estratégica deixou de ser opção e se tornou imperativo de gestão.

— Exame