É preocupante tornar crime o não recolhimento de ICMS

Por Acácio Júnior, advogado empresarial

A Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) negou habeas corpus a dois empresários que alegaram, em processo, que o não recolhimento de ICMS não caracterizaria crime, mas apenas inadimplência fiscal. A decisão do tribunal traz uma polêmica discussão porque o tema, que também será julgado pelo Supremo Tribunal Federal (STF), abre a possibilidade para que empresários, inclusive os que não pagaram seus impostos por conta de dificuldades, sejam punidos como sonegadores, o que é bem diferente.

Pelo inciso II do artigo 2º artigo da Lei 8.137/1990 (que define crimes contra a ordem tributária, econômica e contra as relações de consumo), os casos de não repasse do ICMS aos cofres públicos, são descritos da seguinte forma: “deixar de recolher, no prazo legal, valor de tributo ou de contribuição social, descontado ou cobrado, na qualidade de sujeito passivo de obrigação e que deveria recolher aos cofres públicos”. A pena de detenção varia de seis meses a dois anos além do pagamento de multa.

Em seu despacho, o relator do caso no STJ, ministro Rogerio Schietti Cruz, afirmou: “O fato é típico e, em princípio, não há causa excludente da ilicitude, impondo-se ressaltar que o dolo de se apropriar há de ser reconhecido com base no substrato probatório obtido após a instrução criminal”. O ministro cita ainda que o fato de a empresa registrar, apurar e declarar em guia própria ou em livros fiscais o imposto devido ainda não afasta a prática do delito.

Ponto fundamental a ser considerado é o argumento apresentado pelos empresários do caso em questão. A defesa afirmou que faltaria tipicidade formal no caso de não recolhimento do ICMS próprio, na medida em que não haveria substituição tributária (regime pelo qual a responsabilidade pelo ICMS devido em relação às operações ou prestações de serviços é atribuída a outro contribuinte), mas sim a sujeição passiva tributária direta da pessoa jurídica (sujeição passiva ocorre quando a pessoa jurídica ou física é responsável principal pelo pagamento do tributo e multa). Ainda sobre este aspecto, é importante esclarecer que o artigo 121 do Código Tributário Nacional prevê dois tipos de sujeitos passivos da obrigação tributária: (I) contribuinte, quando tenha relação pessoal e direta com a situação que constitua o respectivo fato gerador e (II) responsável, quando, sem revestir a condição de contribuinte, sua obrigação decorra de disposição expressa de lei.

O argumento da defesa tem todo sentido até porque no STJ, o ministro Rogerio Schietti justificou a necessidade de ser analisada a situação tendo em vista decisões diferentes turmas (Quinta e Sexta) em casos de ICMS incidente em operações próprias e nos casos de substituição tributária.

O caso em questão é, de fato, preocupante. Quando uma turma do STJ decide por criminalizar empresários pelo não recolhimento tributário este cenário abre um imensurável universo para que as cobranças de impostos tenham, naturalmente, um caráter agressivo e que dificulta ainda mais o desenvolvimento da empresa no País.

Ora, é preciso analisar caso a caso e não negligenciar períodos específicos como o desempenho da economia, por exemplo, ou a intenção de boa-fé do empresário que, embora inadimplente com o fisco, honra os pagamentos com empregados e fornecedores mantendo-os em dia. Nesta análise com vistas à ponderação e juízo, é preciso considerar, em tempo, a busca pela renegociação tributária por parte da empresa em débito com o fisco.

Definitivamente, o empresário de boa-fé não é um sonegador contumaz de má-fé da totalidade de suas obrigações fiscais, trabalhistas e com outras empresas. O que se espera é que haja equilíbrio nas futuras decisões dos nossos tribunais sobre o tema e que isso norteie o o bom senso e entendimento do Poder Judiciário.

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