O tema 1209 do STJ e a responsabilização de sócios por dívida tributária

Nos últimos anos, muito se tem discutido sobre a possibilidade de inclusão de sócios ou terceiros como responsáveis por dívida tributária no curso do executivo fiscal, é o chamado redirecionamento da execução, sem que tenha havido qualquer discussão prévia sobre a possível responsabilização desses terceiros (seja no curso de eventual processo administrativo ou desde o início da execução, originalmente movida em face da pessoa jurídica).

Essa situação é bastante comum quando não são encontrados bens para suportar, garantir ou quando não satisfeito o executivo fiscal, ainda que não seja o caso da chamada dissolução irregular da sociedade (que, inclusive, possui previsão expressa para responsabilização dos sócios remanescentes – artigo 134 do CTN).

Em 2015, com a nova sistemática processual (CPC 15) e a criação do chamado Incidente de Desconsideração da Personalidade Jurídica – IDPJ, o tema ganhou novos contornos, mas a aplicação do incidente em matéria tributária foi bastante rechaçada pela doutrina e jurisprudência, como exemplifica o enunciado de número 53, da Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados – ENFAM: “O redirecionamento da execução fiscal para o sócio-gerente prescinde do incidente de desconsideração da personalidade jurídica previsto no art. 133 do CPC/15”. Todavia, quando o tema alcançou o STJ, surgiram posicionamentos divergentes da Primeira e Segunda Turma sobre a aplicação do IDPJ no executivo fiscal.1

A Primeira Turma reconheceu a necessidade de instauração do IDPJ, excepcionalmente nas hipóteses em que a responsabilização de terceiro, não identificado na Certidão de Dívida Ativa – CDA, decorra de hipóteses de abuso de direito, fraude e simulação previstas no artigo 50 do Código Civil e desde que não comprovadas as hipóteses de responsabilidade previstas nos artigos 134 (responsabilidade de terceiros por sucessão, como por exemplo os pais, pelos tributos devidos por seus filhos menores) e 135 (responsabilizada pessoal de terceiros, por tributos resultantes de atos praticados com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos), ambos do CTN.2

Já a Segunda Turma do STJ, ao analisar questão semelhante³, posicionou-se pela incompatibilidade do IDPJ com o rito das execuções fiscais, especialmente porque a responsabilização de terceiros, tratada nos artigos 134 e 135 do CTN, não necessitaria da desconsideração da pessoa jurídica devedora, já que a responsabilidade dos sócios é atribuída por força da própria lei.

Desde 2015, a jurisprudência dos Tribunais em segunda instância ficou bastante diversificada, destacando o posicionamento do TRF-3 que, ao analisar o Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas – IRDR nº 0017610-97.2016.4.03.0000, fixou a tese4 de que para os casos de suposta confusão patrimonial, dissolução irregular, formação de grupo econômico, abuso de direito, excesso de poderes ou infração à lei, ao contrato ou ao estatuto social (CTN, art. 135, incisos I, II e III), e para a inclusão das pessoas que tenham interesse comum, casos em que regularmente são utilizados para sustentar o redirecionamento no curso da execução fiscal, desde que não incluídos na CDA, seria indispensável a instauração do incidente.

Recentemente, o Ministro Franciso Falcão elegeu 5 recursos afetando a matéria para julgamento do tema na sistemática dos recursos Repetitivos (Tema 1209). Este julgamento certamente afetará uma extensa gama de executivos fiscais, de pessoas jurídicas e seus sócios (incluindo pessoas jurídicas de um mesmo grupo econômico), pois poderá definir a necessidade ou não da aplicação do IDPJ para casos responsabilização de sócios ou terceiros, com o redirecionamento do executivo fiscal.

A depender do julgamento, se intensifica a necessidade de adoção de um compliance tributário mais rígido, que defina práticas de regularidade fiscal e o cumprimento das normas fiscais, não só para proteção da sociedade (PJ), mas também para proteção de sócios e administradores que, no caso de eventuais cobranças judiciais das dívidas tributárias, podem ser incluídos no curso desses executivos, sem que haja um procedimento específico para apuração da responsabilidade, impedindo um contraditório amplo, com apuração de provas, a não ser que sejam apresentados bens ou garantias que suportem o valor em discussão.