Reforma tributária pode causar explosão de litígios, diz relatório do STJ
O Superior Tribunal de Justiça, por meio da 1ª Seção, aprovou em abril de 2025 um relatório denso e esclarecedor sobre os prováveis efeitos da reforma tributária no sistema judicial brasileiro.
O documento, fruto do grupo de trabalho instituído pela Portaria STJ/GPnº 458/2024, revela um cenário que vai na contramão da promessa de simplificação: os novos tributos sobre o consumo — o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) e a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) — podem causar uma explosão de litígios, triplicando a atual carga processual tributária.
A principal fonte dessa preocupação é o desenho constitucional e legal da reforma, pois apesar de unificar as bases de incidência e criar uma estrutura normativa comum, manteve a separação entre os entes federativos na cobrança, fiscalização e na representação judicial dos créditos tributários. Isso significa, na prática, que o mesmo fato gerador pode resultar em três lançamentos distintos e, na ausência de pagamento, três execuções fiscais diferentes: uma movida pela União (CBS), outra pelo Estado e uma terceira pelo município (IBS em suas frações estadual e municipal).
O contribuinte que desejar contestar a cobrança também terá que ajuizar ações separadas, enfrentando múltiplos processos sobre o mesmo fato, mas em foros diferentes. A consequência esperada é o aumento exponencial de demandas, especialmente em ações antiexacionais, que exigem discussões mais complexas sobre validade, legalidade e interpretação normativa, e estando já o Judiciário sobrecarregado, dificilmente suportará esse volume sem comprometer a qualidade da prestação jurisdicional.
O relatório do STJ, publicado oficialmente no portal da corte baseado em dados da DataJud e projeções estatísticas, não apenas descreve esse cenário com precisão, mas também propõe soluções estruturadas e práticas, sendo uma das principais sugestões a atribuição da competência exclusiva à Justiça Federal para julgar tanto a CBS quanto o IBS. A proposta parte do reconhecimento de que, embora o IBS seja de competência compartilhada entre estados e municípios, sua legislação é nacional, o que justifica o deslocamento da competência para uma instância única, mais preparada e com jurisprudência consolidada.
Outra ideia relevante do relatório é a criação de faixas de valor para definir quem ajuíza e onde: municípios cobrariam débitos de pequeno porte, estados os médios, e a União os de maior valor. Essa “alçada federativa”, se bem desenhada, permitiria reduzir a multiplicação de processos e racionalizar a atuação judicial, defendendo também o texto a exigência de instância administrativa prévia obrigatória, de forma a reduzir a judicialização precoce e permitir que a administração tributária unifique entendimentos antes que as controvérsias cheguem aos tribunais.
Caminhos complementares
O relatório também analisa a possibilidade — ainda em discussão no âmbito do Executivo — da criação de ações diretas de legalidade (ADL) e ilegalidade (Adil), de competência do STJ, que teriam o potencial de uniformizar interpretações logo no início da vigência dos novos tributos, reduzindo decisões conflitantes em primeira instância. Apesar de reconhecer os benefícios de celeridade e previsibilidade, o STJ pondera os riscos constitucionais de tal modelo: o enfraquecimento do contraditório, da ampla defesa e da maturação das decisões nas instâncias ordinárias.
— Conjur