O divórcio do sócio e os seus impactos na sociedade limitada

O divórcio ou o rompimento de uma união estável, por si só, é um momento bastante delicado para o casal em separação e para seus familiares mais próximos, que enfrentam discussões muitas vezes não tão amigáveis ou até mesmo longos entraves judiciais para definir o destino dos seus bens e demais questões inerentes ao momento.

Se uma das partes figurar como sócia em uma sociedade limitada, o momento pode ser ainda mais complicado e alvo de debates mais atribulados, já que passa a envolver direta ou indiretamente terceiros que muitas vezes nem são tão próximos do casal.

Os impactos que o divórcio ou o rompimento da união estável de um dos sócios poderá gerar para a sociedade limitada estão diretamente relacionados com alguns fatores e decisões anteriormente tomadas por eles, como a escolha do regime de bens da união e as definições nos instrumentos contratuais da sociedade acerca do tema.

No Brasil, o regime mais utilizado pelos casais é o da comunhão parcial de bens, ou seja, comunicam-se todos os bens adquiridos na constância do casamento/união estável por qualquer uma das partes. Então, nesse caso, se as quotas que compõem o capital da sociedade foram adquiridas pelo sócio no período do casamento ou da união estável, serão elas objeto da partilha quando da eventual dissolução da união.

Quer dizer, então, que o ex-companheiro, muitas vezes um completo estranho ao dia a dia e aos negócios da sociedade, passa a ter direito à metade das quotas que eram de titularidade do sócio e poderá usufruí-las como bem entender? Não exatamente!

Apesar das diversas discussões doutrinárias, até mesmo pela interdisciplinaridade que envolve o tema, o entendimento majoritário tem reafirmado a posição do artigo 1.027 do Código Civil. De acordo com tal disposição, o ex-cônjuge ou ex-companheiro do sócio não poderá ingressar na sociedade na qualidade de sócio, mas receberá a sua parcela da meação mediante aspectos patrimoniais das quotas partilhadas, ou seja, através da divisão periódica dos lucros e/ou mediante o recebimento dos haveres das quotas.

Ainda, partilhadas as quotas e acordado que o ex-cônjuge ou ex-companheiro não irá ingressar no quadro societário, mas terá direito tão somente aos aspectos patrimoniais das quotas, a discussão passará a ser em torno de como será feita a apuração dos haveres dessas quotas e de que modo será efetuado o pagamento correspondente. Afinal, o ex-parceiro em questão tem direito ao recebimento dos valores referentes aos respectivos haveres e irá querer satisfazê-lo o quanto antes.

Nesse sentido, apesar do já citado artigo 1.027 do Código Civil estabelecer que o ex-cônjuge não poderá exigir o que lhe cabe a título dos haveres das quotas partilhadas até que a sociedade seja liquidada, o parágrafo único do Código de Processo Civil, ao disciplinar a ação de dissolução parcial da sociedade, define que: “O cônjuge ou companheiro do sócio cujo casamento, união estável ou convivência terminou poderá requerer a apuração de seus haveres na sociedade, que serão pagos à conta da quota social titulada por este sócio”.

Assim, entende-se que, se nada for definido em sentido contrário no contrato social ou se não houver consenso entre os envolvidos quanto à apuração e liquidação dos haveres, o ex-cônjuge ou ex-companheiro poderá imediatamente propor a respectiva ação de dissolução parcial da sociedade com a apuração dos haveres correspondentes.

Fica evidente aqui a importância da inclusão nos contratos sociais de disposições que disciplinem os moldes e critérios a serem utilizados para a apuração de haveres nos casos de dissolução parcial da sociedade, inclusive podendo estabelecer regras específicas para as situações que envolvem divórcio ou rompimento da relação, a fim de minimizar possíveis efeitos não desejados pelos sócios.

Também, outras medidas podem ser adotadas pelos sócios tanto no contrato social como em eventual acordo de sócios para que as consequências desse rompimento possam ser mitigadas. Além da regulamentação da apuração de haveres e regras para o seu pagamento, como a definição do parcelamento dos valores apurados, o contrato social poderá prever expressamente que não será permitido o ingresso do ex-cônjuge ou ex-companheiro de sócio no quadro societário, no caso de divórcio ou rompimento da relação.

Outra alternativa que também se mostra como viável, apesar de não tanto comum no dia a dia, é a definição no contrato social e no acordo de sócios da sociedade de que somente poderão ingressar e figurar como sócios aqueles que, se forem casados ou viverem em união estável, que o sejam pelo regime de separação total de bens. Nesse caso, há a separação patrimonial entre os cônjuges ou conviventes, e isso pode evitar diversas discussões e consequências aqui levantadas.

Diante de todo o exposto, não se pode negar que o divórcio ou o rompimento de uma união estável, por si só, é um momento extremamente complicado e que consequentemente gerará delicados danos aos envolvidos. Entretanto, se for o caso de um deles ser sócio em uma sociedade limitada, existem mecanismos que podem pela sociedade serem utilizados, ficando evidente a importância da regulamentação prévia do tema através dos seus instrumentos societários, a fim de minimizar tais consequências

Fonte: Migalhas

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